Por Nilson Pereira.
1. Introdução – Dados do filme:
A adaptação cinematográfica foi feita pelo
roteirista David Hare e dirigida pelo diretor Stephen Daldry. Foi lançada no
ano de 2008.
O elenco é estrelado pela atriz inglesa Kate
Winslet, ganhadora do Oscar de melhor atriz em 2009, por conta de sua atuação
em O Leitor, pelo ator alemão David
Kross e por Ralph Fiennes, ator de
nacionalidade inglesa, que interpretam o mesmo personagem, Michael Berg, em
idades diferentes.
O filme teve indicações ou venceu os principais
prêmios da indústria cinematográfica mundial.
Cinco indicações ao Oscar de 2009 (melhor filme, melhor diretor, melhor
roteiro adaptado, melhor fotografia e o de melhor atriz, no qual Kate Winslet
venceu).
Quatro indicações ao Globo de Ouro de 2009
(melhor filme, melhor diretor, melhor roteiro original e melhor atriz
coadjuvante, prêmio no qual Kate Winslet venceu também).
Três no Festival de Cannes em 2009 (Palma de
Ouro, Grand Prix e melhor interpretação feminina, mais uma vez vencida pela
atriz Kate Winslet). Três indicações ao prêmio British Academy of Film
and Television Awards 2009 (melhor filme, melhor diretor e melhor atriz, no qual Kate
Winslet venceu). Uma indicação ao SAG
Awards assim como ao European Films
Awards ambos de 2009, ambos de melhor atriz, vencido pela Kate Winslet nos
dois casos.
O filme é
considerado um grande sucesso de público e crítica, arrecadando a bilheteria no
valor de $ 33.484.347,00 nos três primeiros meses de exibição somente nos
Estados Unidos.
2. Enredo do
filme e do livro:
I-
O filme:
O filme se passa em Berlim, em 1995, quando o
personagem Michael Berg (interpretado por Ralph Fiennes) remete sua lembrança à
Alemanha dos anos de 1950, pós Segunda Guerra Mundial, especificamente em 1958.
Ao ver pela janela um U-Bahn amarelo
(transporte coletivo usado na Alemanha no decorrer do século XX, que lembra um
bonde), Michael Berg lembra-se de quando tinha a idade de 15 anos (aqui interpretado
por David Kross), na cidade Neustadt, onde sua família morava até então, passa
mal durante o trajeto feito pelo U-Bahn. Michal para em frente a um prédio, onde
vomita, e é socorrido por Hanna Schmitz (interpretada por Kate Winslet),
moradora do prédio e trocadora de U-Bahn.
Ao voltar para casa, o médico diagnostica Escarlatina,
receitando que Michael fique de cama por três meses. O personagem passa a ler
bastante neste tempo de recuperação. Ao ficar são, comenta com sua mãe que uma
mulher o ajudou quando ele passou mal e ela o aconselha a ir visitar sua
benfeitora.
Michael vai visitar Hanna, os dois se envolvem e acabam tendo
um caso. No decorrer do tempo, Hanna indaga o jovem sobre o que ele aprende na
escola, e passa a pedir para que ele leia os livros que usa na escola. Títulos
como A Odisséia de Homero, A dama do cachorrinho de Anton Checkhov,
e Huckleberry de Mark Twain. Hanna e
Michael passam a se encontrar sempre com uma sessão de leitura e uma relação
sexual.
Entre alguns conflitos por conta de posturas rígidas de
Hanna, somadas a imaturidade de Michael, os dois mantém a relação, até que
Hanna é promovida de trocadora para trabalhar no escritório de sua empresa,
mudando sem avisar Michael, desaparecendo. O jovem estudante então sofre bastante
com isto.
O filme passa a retratar o ano de 1966, quando o jovem
Michael cursa direito na Universidade de Heiderlberg, e participa de um
seminário conduzido pelo professor Rohl (Interpretado por Bruno Ganz), judeu
que sobrevivente da Segunda Guerra.
Em dos julgamentos que acontecem na Alemanha neste período,
Michael se depara com o julgamento de algumas mulheres acusadas de serem
coniventes com a morte de trezentas judias queimadas vivas em uma igreja de
Auschwitz (um acontecimento fictício que no filme é ilustrado e que parte de um evento histórico real, a
chamada ‘’Marcha da Morte’’, onde as tropas aliadas invadem a região da
Normandia, assim como as tropas soviéticas ocupam cada vez mais territórios
antes da Alemanha nazista, e os alemães passam a ter que recuar, levando
consigo os prisioneiros de guerras judeus, antes em campos de concentração
localizados nos territórios que os aliados tomam) no ano de 1944.
Para a surpresa de Michael, uma das acusadas era Hanna. Acontece
uma das cenas mais impactantes do filme, quando Michael visita um antigo campo
de concentração por estar atordoado com a descoberta que Hanna era uma ex guarda
da SS, polícia da Alemanha nazista. Há uma discussão no seminário, um aluno se
posiciona a favor de uma punição rigorosa as acusadas e isto mexe com Michael.
O depoimento de Ilana Mather (interpretada por Alexandra
Maria Lara), autora de um livro que narra como ela e sua mãe sobreviveram ao
campo de concentração de Auschwitz, é decisivo para o desenrolar do processo.
Hanna admite todas as acusações que lhe são impostas, menos a
suposta autoria de um relatório redigido após as mortes na igreja, porém, as
demais rés a acusam de ter escrito e de ter sido a mente arquiteta de todo o
fato. Hanna acaba admitindo a acusação por vergonha, uma vez que o juiz pede a
ela que dê uma amostra de sua caligrafia, e ela prefere se acusar do que
mostrar que era analfabeta. Michael enfim entende que Hanna sempre fez de tudo
para guardar este segredo, seu analfabetismo, por isso pedia a ele para ler
para ela.
Michael tenta contar a seu professor que sabia de uma
informação que poderia mudar todo o curso do processo, porém, não conta a ele o
que é, uma vez que a própria Hanna prefere ocultar o fato de ser analfabeta. O juiz
dá a sentença, diferenciada para as outras rés, e prisão perpétua a Hanna,
acusada de ser mentora de tudo.
Michael se casa, tem uma filha, se
divorcia. Visita sua família em Neustadt, revê seus
livros, os que lia para Hanna, tem a ideia de gravá-los em fitas cassete e as envia
junto a um toca fitas a Hanna na prisão. Ela começa a aprendera ler e a
escrever, associando os livros às fitas, passando a enviar cartas para Michael,
que nunca responde as cartas, mas continua a enviar as fitas.
Em 1988,
Michael é surpreendido com um telefonema de uma funcionária da prisão, pedindo
que ele ajude Hanna na sua reintegração junto a sociedade, pois a mesma havia
estado mais de 20 anos presa. Michael finalmente a visita, com várias opções
para que Hanna seja ajudada. Ela se suicida na noite anterior a sua libertação.
Deixa um pote com uma quantia em dinheiro exposta em uma carta que a mesma
deixou.
Hanna queria
que Michael procurasse Ilana e a desse o pote com o dinheiro, ele vai aos
Estados Unidos e se encontra com Ilana, que numa conversa, fica com o pote mas
pede a Michael que invista o dinheiro onde este desejar, ele então tem a ideia
de investir estas economias em uma instituição de ajuda ao combate do
analfabetismo.
O filme termina
com uma bela cena, onde Michael leva sua filha para visitar o túmulo de Hanna,
e conta toda a sua história vivida com ela, explicando o porque de várias
atitudes estranhas dele ao redor de sua vida.
II-
O livro:
Como toda obra
adaptada para o cinema, O Leitor na
sua versão de livro é muito mais abrangente se comparada ao filme. Com muito
mais riquezas de detalhes e até mesmo com uma leitura diferente dos
acontecimentos.
O livro gira em
torno dos debates de consciência de Michael, sobre todos os fatos acontecidos
em sua vida e que remetem a Hanna, o filme não, se preocupa mais em mostra os
fatos, por muitas vezes, os pensamentos de Michael não subentendidos apenas, no
livro, são o cerne das questões quase que o tempo todo, a base da narração, o
que torna o livro muito mais rico.
No livro há uma
ênfase muito maior de personagens, como na mãe de Michael, que era professora
de Filosofia, suas descrições em relação aos irmãos, e sobre toda sua família
em si. Há diálogos riquíssimos entre Michael e seu pai por exemplo, não
relatados no filme, o pai de Michael no cinema praticamente não tem destaque,
assim como sua família no geral, algo que o livro valoriza muito.
O livro se
inicia com Michael aos 15 anos de idade, não com uma lembrança de sua fase
adulta, como no filme, e sim com uma narrativa dele enquanto adulto. Na versão
literária, Michael teve hepatite, e não escarlatina, como retrata o filme. A
cidade onde Michael morava no livro chamava-se Blumentrasse, Hanna morava em
Bahnhofstrasse, e não em Neustadt, coforme o filme relata.
O livro conta
que um homem conduz Michael ao apartamento de Hanna, fato que não ocorre no
filme, além de detalhar precisamente a timidez de Michael, suas refutações e
desistência de ir ao encontro de Hanna, acontecimentos ocultados no filme. No
filme, existe a personagem Sophie, porém, não retrata um caso de Michael com
ela, fato que acontece no livro.
O crime na qual
Hanna era acusada no livro é diferente da adaptação cinematográfica, no livro o
crime foi o de um bombardeio a um campo de concentração, e não um incêndio numa
igreja, conforme relata o filme. Este campo ficaria perto de Cracóvia, era
ligado a Auschwitz, porém, não era lá, conforme ocorre no filme.
O livro dá muito
mais ênfase a obra literária escrita por uma sobrevivente, dá também riqueza de
detalhes do julgamento, diálogos entre Hanna e seu advogado, troca de olhares
entre ela e Michael durante o julgamento, acontecimentos não relatados no
filme.
O livro se
preocupa em descrever partes do casamento de Michael com a personagem Gertrud
além de acoplar a realidade dos personagens ao contexto histórico com maior
maestria, haja vista que Michael é especialista em estudar o Direito no
Terceiro Reich, algo nem se quer dito no filme.
Michael visita o túmulo de Hanna sozinho, embaraçado com suas lembranças
e interpretações do passado, no filme ele vai com sua filha Julia.
3.
Contextualização histórica:
O filme O
Leitor foi produzido no final da primeira década dos anos 2000. Neste
período histórico, explodia a crise econômica que assola a Europa e os Estados
Unidos até os dias de hoje, particularmente em países europeus, o desemprego
aumentou bruscamente, e a crise econômica começara a ecoar nos cenários social
e político no continente, ao ponto do fantasma da ideologia nazista, através de
partidos políticos de orientação ultra-direitistas, ganharem notoriedade no
cenário político em alguns países.
O cenário descrito no parágrafo anterior lembra
bastante o cenário histórico do pré-Segunda Guerra Mundial, assolado pela crise
econômica de 1929, onde a ideologia nazista e fascista, antiliberais, e
antidemocráticas, ganharam notoriedade na Alemanha e em outras regiões
europeias, conforme descreve o historiador José Robson de Andrade Arruda, em
seu artigo ‘’A crise do capitalismo liberal’’. (ARRUDA, 2000, p. 22)
O belíssimo filme O Leitor, a meu ver, foi redigido, produzido e lançado exatamente
no fim da última década, para levantar uma reflexão sobre as condições que uma
ideologia como nazismo pode acarretar em uma sociedade, afinal, um dos
elementos que mais me chamou a atenção, tanto no filme, quanto no livro, é o
impacto que causa ao cidadão alemão comum, retratado pelo personagem Michael
Berg, e por outros que compõe o enredo das duas versões, quando se toca na
questão da Segunda Guerra.
Nem o filme nem o livro são narrados dentro do
contexto da Segunda Guerra em si, os acontecimentos que acusam a personagem
Hanna como ex guarda da SS, são remetidos no enredo, não acontecidos no real time da história, porém, a todo
o momento a Alemanha nazista está em volta do cotidiano dos personagens, ainda
que esta não existisse mais.
A lição por trás do enredo está bem de acordo
com o que o filósofo alemão Theodor Adorno, em seu artigo ‘’ Educação após
Auschwitz’’ mostra:
‘’A exigência
de que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação. De tal
modo ela precede quaisquer outras que creio não ser possível nem necessário
justificá-la. Não consigo entender como até hoje não mereceu tão pouca atenção.
Justificá-la teria algo de monstruoso em vista de toda a monstruosidade ocorrida.
Mas a pouca consciência existente em relação a estas exigências e as questões
que ela levanta provam que monstruosidade não calou fundo nas pessoas, sintoma
de persistência da possibilidade de que
se repita no que depender do estado de consciência e de inconsciência das
pessoas.’’ (ADORNO, sp)
Na última Eurocopa, este receio impactante
entre os alemães e o nazismo, ficou ainda mais evidente. A competição foi
disputada conjuntamente entre Ucrânia e a Polônia, país este que abrigou
diversos campos de concentração nazistas, antes do início dos jogos, a
delegação alemã visitou um destes campos, um momento emocionante sem dúvidas,
para eles e para todos que avistaram este acontecimento.
Não importa o envolvimento, se houve ou não,
nem a que geração alemã pertence o indivíduo, haverá na maior parte dos casos
um relacionamento particular entre os alemães e a História da Segunda Guerra. O
livro e o filme retratam isto com maestria, improvável não perceber a
emoção do momento no qual o personagem
Michael visita um campo de concentração, ou simplesmente quando o julgamento de
Hanna é propagado de alguma forte no enredo da história, seja no filme, seja no
livro.
4. Referências Bibliográficas
SCHLINK, Bernhard.
O leitor. Rio de Janeiro: Record, 2003.
ARRUDA, José
Jobson de Andrade. A Crise do capitalismo
liberal. In FILHO, Daniel Aarão Reis. O
século XX. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2000.
http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Leitor.
Wikipedia (2001). Acessado no dia 28/05/2013, às 17 horas.
ADORNO, Theodor. http://www.educacaoonline.pro.br.
Educação on-line (2003). Acessado no dia
28/05/2013, às 17 horas.